Comunicar aos empresários que o regime de mercado está em pleno vigor foi o que norteou a edição da Medida Provisória (MP) da Liberdade Econômica, transformada na Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019. A legislação também lembra ao governo que ele não deve criar barreiras ao livre funcionamento do mercado.
A reafirmação do princípio constitucional da liberdade de iniciativa, em vigor desde 1988, tem por finalidade dizer a toda a sociedade que o país somente se desenvolverá e crescerá se todos acreditarmos no liberalismo. Entendo que o liberalismo é a garantia da liberdade para todos. As empresas terão a ganhar, e os trabalhadores terão trabalho e condições dignas de vida.
Acredito que a MP não era nem relevante nem urgente, e a Lei serve para relembrar a todos que temos vigente no Brasil, desde 1988, um regime de economia de mercado e suas garantias. Há um brocardo latino que diz: “repetita juvant”, as coisas repetidas ajudam. De tanto repetir, aprendemos. Era assim que nos valíamos das famosas “cartilhas”, ou até mesmo das “taboadas”.
Para quem já leu e entendeu a Constituição, promulgada em 1988, não se pode dizer que houve “novidades”. E eu diria que, se tivesse havido “novidades”, seriam elas inconstitucionais. O balizamento dos princípios constitucionais liberais do regime de economia de mercado ficou definitivamente estabelecido nos Títulos I, II e VII, da Constituição. Logo, qualquer novidade somente poderia acontecer com uma emenda constitucional.
Aliás, o que posso admitir como “novidade” seria o esmiuçamento dos “mínimos detalhes”, com certo menosprezo para a capacidade intelectual dos empresários, dos cidadãos, dos administradores públicos. Exemplifico esta crítica com a definição trazida no § 6º do Artigo 1º da Lei 13.874/19: “Para fins do disposto nesta Lei, consideram-se atos públicos de liberação a licença, a autorização, a concessão, a inscrição, a permissão, o alvará, o cadastro, o credenciamento, o estudo, o plano, o registro e os demais atos exigidos, sob qualquer denominação, por órgão ou entidade da administração pública na aplicação de legislação, como condição para o exercício de atividade econômica, inclusive o início, a continuação e o fim para a instalação, a construção, a operação, a produção, o funcionamento, o uso, o exercício ou a realização, no âmbito público ou privado, de atividade, serviço, estabelecimento, profissão, instalação, operação, produto, equipamento, veículo, edificação e outros”.
Agora, a legislação tem vários pontos falhos, vou destacar três. Em primeiro lugar, o Artigo 2º é absolutamente desnecessário. O que ali está escrito já consta explicitamente do texto constitucional (artigos 1º, 3º, 170, 173 e 174), e da legislação ordinária (Lei de Defesa do Consumidor, por exemplo), ratificado já por decisões judiciais.
Além do mais, o Artigo 19 diz que fica revogada a Lei Delegada nº 4, de 26 de setembro de 1962. Isso mostra desconhecimento do disposto na Constituição, tanto no Artigo 173, bem como na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro. A “intervenção do Estado no Domínio Econômico” já não mais vigorava. Aquela lei delegada já estava revogada desde 1988. E a Superintendência Nacional de Abastecimento (SUNAB) – que foi um órgão do governo federal, criado em 1962 pelo presidente João Goulart, que dava cumprimento à “intervenção” – foi extinta em 1997.
Também é curiosa a redação do Artigo 20: “Esta Lei entra em vigor: I- vetado II- na data de sua publicação, para os demais artigos”. Fica a pergunta: “quais artigos seriam”?
No meu ponto de vista, tanto a medida provisória quanto a lei deveriam ter incluído um artigo: “todos devem ler, entender e pôr em prática a Constituição Federal de 1988”.